sexta-feira, 4 de dezembro de 2015

Agricultura biodinâmica leva em conta fases da lua e signos do zodíaco

Fonte: Revista Globo Rural
Ramo da antroposofia, método foi criado em 1924 por Rudolf Steiner

POR THUANY COELHO, DE SÃO JOÃO DA BOA VISTA (SP) I EDIÇÃO: VIVIANE TAGUCHI


Gabriel Vidolin, chef, proprietário do Restaurante Leao Vermelho com Elizabeth M. Scheichl, proprietária da Fazenda Alegre / Foto: Rogerio Albuquerque (Foto: Rogério Albuquerque/Ed. Globo)

A pedra fundamental da agricultura biodinâmica foi colocada por Rudolf Steiner em 1924, durante o Congresso de Pentecostes, na Polônia, quando ele apresentou um ciclo de oito palestras para agricultores. “A filosofia mais ampla se chama antroposofia. E ela abrange várias áreas do conhecimento. A agricultura biodinâmica é um ramo da antroposofia”, conta o chef Gabriel Vidolin, do restaurante Leão Vermelho, em São João da Boa Vista, que trabalha com esse método em sua horta.

A antroposofia é uma forma de conhecimento que aborda o ser humano em diversos níveis, como o físico, o vital, e o espiritual, e mostra a inter-relação deles. “No caso da agricultura, é entender de maneira mais profunda quais são as relações do homem, da terra e da existência”, diz o chef. “Ele pega todo o conhecimento folclórico dos povos europeus e aplica na agricultura”.

A teoria ainda faz relação entre os signos e os meios de cultivo, utilizando um calendário celestial. De acordo com o biodinamismo, dependendo do signo da época, algumas plantas se desenvolvem melhor que outras. “Nós dividimos em quatro: água terra, fogo e ar. Os signos de água são mais propícios para plantas que a gente vai usar o caule. Os de terra, as raízes; os de fogo, as frutas; e os de água, as folhas e as flores”, explica.

As fases da Lua também estão presentes no calendário da agricultura biodinâmica. “A gente sempre semeia em lua nova, porque nesse momento a energia da semente está mais interiorizada. Na crescente, ela começa a se desenvolver; na lua cheia, a planta está em plenitude e na minguante, é quando a gente não pode abusar da colheita”, afirma. “E a gente sempre faz a colheita ou às 10h ou às 16h, que são os horários em que a terra está mais propícia e os hormônios da planta estão no ápice”.


Na antroposofia, os adubos são preparados com plantas medicinais, silício e esterco para serem absorvidos pelo solo de acordo com as influências do planeta (Foto: Rogério Albuquerque/Ed. Globo

Outra parte importante da filosofia biodinâmica são os preparados, espécie de adubos naturais elaborados a partir de plantas medicinais, esterco e silício, enterrados no solo para serem submetidos às influências da Terra. Eles podem ser divididos em dois grupos; os que são pulverizados no solo e nas plantas, e os que são inoculados em composto ou outras formas de adubos orgânicos como biofertilizantes e chorumes. Os preparados são numerados de 500 a 508, como uma forma de facilitar a comunicação internacional.

O mais famoso deles é o 500, cuja função é ajudar no desenvolvimento da planta. Segundo o chef do Leão Vermelho, o preparado é feito sempre no solstício de inverno, “quando as forças de cristalização da terra estão mais acentuadas”. “Pega-se chifre de animais mortos e coloca esterco, depois enterra dentro de um buraco. No próximo solstício, desenterra e mistura”.

Fazenda Alegre

Os preparados que Gabriel utiliza são produzidos na Fazenda Alegre, também no município de São João da Boa Vista. “No biodinâmico, você presta mais atenção nas coisas, isso que é legal. O efeito está lá porque você se preocupa”, ressalta a alemã Elizabeth Scheichl, proprietária da fazenda. .

No local, ela planta café, palmeiras exóticas, cria bezerro para consumo interno e javaporco, cruzamento de porco e javali, característico de climas temperados. Além disso, reflorestou metade da área com espécies nativas da região. “Essa era a condição do meu marido quando compramos a fazenda 18 anos atrás”.

Há seis meses, Elizabeth e Gabriel trabalham em parceria para comercializar o café produzido na propriedade. Já com embalagem pronta, ele deve começar a ser vendido na região nessa primeira fase de testes. “É um café puro, seco no terreiro. É muito honesto”, diz Elizabeth sobre o sabor. Ela, que ainda não consegue lucrar com o cultivo, conta que começou a investir na agricultura orgânica há 10 anos, mas “sempre esbarra no preço, que não é muito mais alto que o convencional na hora de vender”.

Na fazenda, o biodinamismo está também na harmonia das relações entre as espécies. As teias de aranhas são deixadas intactas, como forma de equilibrar a cadeia. “Elas são inimigos naturais até do mosquito da dengue”, afirma Elizabeth.

Leão Vermelho

Depois de estagiar em renomados restaurantes como o El Bulli de Ferran Adrià e o D.O.M. de Alex Atala, Gabriel decidiu abrir seu próprio restaurante, três anos atrás, com uma proposta bem diferente e misteriosa: a cada noite, serve apenas quatro pessoas. Seu menu degustação tem 24 passos e varia a cada temporada, que dura em média seis meses - este ano começa no dia 13 de dezembro e custa R$ 365 por pessoa.

No restaurante, do ovo ao peixe, quase tudo vem de produtores locais. Na sua horta, cultiva ervas e flores comestíveis. Com a seca, das 130 espécies sobraram apenas 60. Trabalhando sozinho, além de cozinhar, Gabriel também é o marceneiro do lugar. Todos os móveis foram idealizados e feitos por ele, que aprendeu o ofício com um amigo.

No próximo ano, Gabriel faz planos para movimentar a cena gastronômica da cidade: “quero receber um jovem chef para cozinharmos a quatro mãos”. Além disso, ele planeja um acampamento de novos cozinheiros e um almoço aos domingos voltado para os moradores de São João da Boa Vista. “A maioria das pessoas que vem ao restaurante não mora aqui”.

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